MAMÃ É MACHAMBEIRA





Caros leitores, as nossas mamanas contam várias histórias sobre a vida. Gosto tanto de ouvi-las que decidi criar pequenos diálogos a partir da vida das nossas mães. Quero tentar dar voz e partilhar os sentimentos das nossas mamanas com diálogos sem inicio e fim, porque acho que a vida é uma história que nunca termina.

O texto a “Mamã é machambeira” retrata a história de um casal, em que a mulher é que teve que batalhar pela educação dos filhos, enquanto o pai se distraia com as coisas do mundo.


Marido vamos plantar, vamos melhorar os meios de produção, podes me ajudar a plantar? Já jogamos a semente precisamos regar.

Tu não queres? Então, permita-me sachar, deixa-me regar essas plantas. Pois, sei que um dia vou colher destas machambas, preciso garantir o alimento e alento quando a velhice chegar ‒ insistiu a mamã.

Eu não sei como se deve cuidar de roseiras, estou exausta, mas não posso parar, por que não queres me apoiar?

‒ Parece levar muito tempo, mas as roseiras crescem rápido, em poucos anos irei colher e descansar ‒ Se consolou a mamã.

Esposa vamos colher? ‒ Perguntou o papá.

Mas…, naquela altura, naqueles anos, disseste que não tinhas condições, deixaste-me sozinha com estas roseiras. Eu…, também não tinha condições, mas lutei sem força e sem teu amparo. Marido, tu foste cuidar de plantações alheias e lá deixaste outras sementes.

Marido, tu foste embora, esqueceste das sementes que me deste para fertilizar, foste para longe. Hoje as roseiras aprenderam a viver com sua ausência. Tu te distanciaste de mim, te tornaste hóspede na tua própria casa, viveste sem pensar nas suas sementes.

Parte da sua família, te aplaudiu, e riu-se de mim e das minhas roseiras. Disseram que estavas certo em nos abandoar. Te apoiaram todas as vezes que foste mostrar filhos de outros ventres, até chegaram a estabelecer comparações entre os meus filhos e os seus, fruto de múltiplos ventres ‒ a cada palavra, a mamã revivia o seu passado doloroso.   

Eu fertilizei suas sementes, hoje nossos filhos estão crescidos. Marido, que fazer…? prontos, vamos colher.

Esposa, me parece que nossos filhos só se lembram de ti, me sinto isolado e enciumado sempre que trazem os frutos para ti‒ disse o papá.

Marido, na sua ausência disfarçada de presença fui esposa, mãe, pai, dona de casa, machambeira e vendedeira. Eu vesti suas calças para pôr ordem na nossa casa. Olha…, não contei aos seus filhos que estavas ausente, insisti várias vezes que seus filhos te honrassem.

Hoje nossos filhos são crescidos, aprenderam a ver e a ler o meu rosto de tristeza ‒ continuou a mamã ‒ Marido, eu fui muita coisa na sua ausência, mas não cheguei de te tirar o mérito de ser o chefe de família.

Por que sentes ciúme? Se por tanto tempo não pensaste nos seus filhos? Eu chorei para a tua família, não ouviram meus gritos, nem a fome dos nossos filhos criou remorso á tua família.

‒ Marido por que dizes que nossos filhos depositam a confiança mim e não dividem por igual os frutos que trazem. Por que perguntas a mim o que será de ti quando adoeceres? E se nossos filhos cuidarão de ti, tal como cuidam de mim?

Meu querido esposo, eu já disse: vamos colher. As sementes são suas, mas o cuidado foi todo meu. Agora, precisamos ensinar aos nossos filhos que uma família é como uma machamba. Quando jogamos as sementes, devemos estar preparados para cuidar, regar, sachar até que cresçam.

‒ Meu querido, não te compares a mim, eu agora apenas quero descansar, as minhas roseiras já sabem tomar conta delas mesmas e de mim. Eu apenas quero descansar, se for para colhermos, por favor, não te compares.

(Inspirado no texto da Maria Henriques)

Imagem: https://www.dw.com/pt-002/prosavana-desenvolvimento-da-agricultura-local-ou-monoculturas-para-a-exporta%C3%A7%C3%A3o/a-17128512


Comentários

  1. É uma proposta que no fundo traz à tona as vivências das nossas mães, convidadas a serem verdadeiras "Kossicazes", em prol do bem estar das suas sementes e da família.
    Estas mães que despem as suas vontades e sonhos, penhoram os seus prazeres e cultivam respeito e consideração a um "chefe ausente", pois sabem que algum dia, quando o néctar de lá acabar, cá voltará, mas não poderá recuperar o que perderam.

    Nossas famílias têm o cheiro do suor das mães. Verdadeiras guerreiras.

    Macie

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    1. Macie... Obrigada por comentar aqui no blog humanidade... As nossas mamãs conhecem todas as ciências que nós os filhos estudamos, mas garanto que em termos de experiências e resiliência nos superam.. São verdadeiras batalhadora com capacidade de transformar suas sementes em grandes plantações

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  2. Wau. Este é um carácter que todos deveriam adotar. Mais são poucos que tem estes fios de pensamento...

    Mães guerreiras que não se conforma com qualquer situação que seja que sempre procuram o lado positivo das coisas....


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    1. São todas elas, nossas grandes referências Tawanda. Não há como não falar de resiliência sem pensarmos nas nossas mamãs

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  3. Wau. Este é um carácter que todos deveriam adotar. Mais são poucos que tem estes fios de pensamento...

    Mães guerreiras que não se conforma com qualquer situação que seja que sempre procuram o lado positivo das coisas....


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  4. Felizmente para a minha mãe e para minha Madrasta infelizmente pois o Meu querido Papa foi cuidar de plantações alheias, e eis me aqui, Eu a semente que ele deixou. Mas nem por isso vivo para baixo, pois a minha Mãe foi sempre guerreira e conseguia fazer com que eu não me sentisse mal por ser uma semente alheia.

    Às Mulheres são excepcionais 💞

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    1. Querida leitora, infelizmente mesmo para as mães, madrasta e pais, pois as crianças no fim de tudo é que acabam por ficar no meio desta confusão toda. Que seria dos lares sem essas mulheres resilientes, que dão tudo pelas suas crias.
      Aqui estamos nós, resultado de mães que dão e deram um pouco de si para que este mundo não nos engula

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  5. Espelho de muitas famílias atuais... bom ver que não há obstáculo que impeça uma verdadeira mãe guerreira de proteger suas sementinhas. E cá estamos nós, como prova viva disso. Excelente reflexão, parabéns!

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    1. Querido leitor, esta é a realidade das famílias moçambicanas, não há verniz possível que se possa passar para embelezar esta dura e desafiante realidade. Aqui estamos graças a resiliência das nossas mamães.

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  6. Uau!
    Esse texto trás a reflexão de uma vida em forma de machamba. Expressa muito sobre alguns lares. Muitas mulheres têm plantado e cuidado muitas vezes do lar e os homens só se fazem presente na época da colheita porém, eles esquecem que os filhos crescem e aprendem a conjugar todos os acontecimentos mas ainda assim, esperam a mesma consideração que é atribuída a mãe e dizem muitas vezes, terem feito as coisas de forma correta.
    É realmente uma reflexão excepcional. Parabéns!

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    1. Lubeila o que mais me espanta é a compaixão que muitas delas têm por nossos pais que são chefes de família sem que tenham aprendido sobre a liderança. Há muitas mulheres carregando as sementes em seus ventres e costas, elas até chegam a carregar o próprio homem

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    2. Parabéns a nossas "machanbeiras" o que seria de nós sem elas e aos nossos entittulados "pai" é qualquer um que procria e não esperem nossos mimos sem serem merecidos as nossas heroínas que por um simples semblante sabem está famínta ou sácia a elas o nosso muito obrigado.

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  7. A figura da Mulher quando é Mãe dentro de um lar é muito poderosa eu reconheço a grande sabedoria que as Mulheres tem apartir da visão e respeito que tenho pela minha Mãe, as Mulheres são capazes do impossivel para cuidar dos seus filhos, isto é divino... A Mulher é uma figura de sabedoria.

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