PARA QUE SERVE A BIBLIOTECA PÚBLICA E O JARDIM TUNDURO, SE NÃO ESTÃO PARA SERVIR AO PÚBLICO?

 



Para que servem os espaços públicos em Maputo se não são para serem usados? É necessário começar o texto de hoje em jeito de pergunta, porque a muito tento responder esta questão, porém, apenas me lembro deste grave problema quando, mais uma vez preciso usufruir dos serviços e dos espaços públicos, mas percebo que as biblioteca e os jardins da cidade de Maputo servem como enfeite e não estão para satisfazer as necessidades dos cidadãos.

O dia de hoje foi corrido, minha colega e eu, buscávamos incessantemente um espaço onde pudéssemos estudar, visto que o ambiente de casa já não consegue responder a nossa necessidade, nesta busca,  criamos várias possibilidades, como bibliotecas e jardins, no final só ganhamos a frustração de ver que as bibliotecas estão  fechadas por causa do Corona Vírus e um jardim como Tunduro fecha as 15h30, o famoso horário do Estado em que muitos de nós chegamos tarde e saímos cedo.

O Indiano Shiyali Ramamritam Ranganathan, cunhou em 1931 as cinco leis da biblioteconomia, e neste momento apenas me interessam a primeira e a última. Na primeira lei o pensador afirma que o livro (e neste caso, a biblioteca) é para ser usada, e na quinta lei, elucida que a biblioteca em um organismo em crescimento.

Pelo visto, este pensador, no tempo em que viveu, já tinha consciência de quão a biblioteca é importante para a formação do leitor, cidadão e estudantes, mas, no meu país, e em tempos de COVID, as bibliotecas, nacional, universitária e privadas não estão para ser usadas, mas se calhar para funcionarem, sem que estejam a prestar serviços aos seus “clientes” usuários por causa da pandemia. Caro leitor, o que seria do bar sem seus clientes?

Será que as bibliotecas não estão a funcionar por causa da pandemia? A muito temos estudado a precariedade dos serviços destes espaços, e o que constatamos é que geralmente, falta vontade política para colocar estes lugares a funcionarem à serviço e para o bem do público.

Eu pergunto: Onde o cidadão buscará informações utilitárias se os espaços que deveriam ajuda-lo a sanar suas inquietações encontram encerradas? Onde os estudantes estudarão no contexto virtual ou presencial se a biblioteca não tem acesso à internet, e muito menos se encontra aberta ao público? As aulas já iniciaram, no entanto, não há espaços onde se possa estudar.

As situações descritas acima, me remetem a uma utopia pandémica, em o país  quer resolver os problemas trazidos pelo Corona Virus, todavia finge ter uma amnésia sobre os problemas que já existiam, e hoje, se utiliza a pandemia como justificação para não se prestar serviços ao público.

Meu professor, sempre me pergunta, é possível dormir numa biblioteca? E várias vezes pensei em dizer não, mas quando descobri que a biblioteca é uma casa da invenção, e ela está para satisfazer às necessidades informacionais das comunidades, percebi que neste espaço é possível criar, imaginar, criticar, analisar, ser e estar de todas as formas. Para nós, a biblioteca é uma assembleia de utilizadores de informação, logo, ela deve ser pensada para responder às necessidades dos usuários ou utentes.

Caros leitores, sabia que os Estados Unidos usa espaços como a biblioteca para americanizar os estrangeiros? Que na África do Sul, os bairros onde não existe eletricidade e que as habitações são exíguas, as bibliotecas públicas estabeleceram como prioridade a disponibilização de instalações mobiladas e com iluminação artificial?

Você sabia que um dos objetivos chave dos serviços bibliotecários em áreas rurais da Venezuela consistiu em melhorar a qualidade de vida dos pequenos agricultores de fracos recursos, prestando-lhes informações sobre agricultura e criação de animais? (para mais exemplos animadores sobre como a biblioteca pode estar a serviço do público leia o Manifesto da IFLA e da UNESCO sobre os serviços da biblioteca pública).

E agora, o que dizer do Jardim Tunduro? Bem, nalgum momento sonhei que este jardim pudesse se reinventar, e se calhar tentar ser como el parque del Retiro, um espaço (parque) público madrileno, que fica aberto ao público até as 21h e está pensado para diversos tipos de público.

Caros leitores, será que é um sonho imaginar o Tunduro, e os demais jardins da cidade de Maputo com tomadas para se carregar, computadores ou celulares? Será que é sonho poder pisar e deitar-me na relva destes espaços? Será que é uma miragem pensar que estes espaços podem ser projetados para receber diversos tipos de público e poder-se estudar, namorar, fazer piqueniques e ler?

O pior de tudo, é saber que os administradores destes espaços passam férias em outros continentes, e nem sequer se inspiram para melhorar os serviços que nos prestam aqui na nossa pérola do índico. Você sabia que para fazer fotos no Jardim Tunduro é necessário pagar?  Mas, o que significa "espaço público" ?

Ao fazer uma busca rápida no Google, vejo que espaço publico é um lugar de uso comum e posse de todos, nele se desenvolvem atividades coletivas, com convívio e trocas entre grupos diversos que compõem a heterogénea sociedade urbana (…). 

Ademais, as áreas públicas moldam os laços comunitários nos bairros. São locais de encontros e sua apropriação pode facilitar a mobilização política, estimular ações por parte dos moradores e ajudar a prevenir a criminalidade (…), quanto mais diversificados e vivos os espaços de uma cidade, menos desigual e mais rica e democrática torna-se a sociedade.

Caros leitores, será que os nossos espaços públicos, estão efetivamente a cumprir com os pressupostos estabelecidos acima? Por que tenho que pagar para tirar uma foto no jardim Tunduro? Por que estes locais fecham às portas no mesmo momento em que abrem? Como é que estes locais estão a contribuir para diminuir as desigualdades sociais na nossa cidade? Será que o Tunduro foi projetado somente para fotos de casamentos, já que se espera que os noivos ou os fotógrafos paguem por isso? afinal, não é um espaço público?

Tenho tantas perguntas sem respostas, ainda assim, continuo a sonhar igual ao Luis Milanesi que em seu livro a “casa da invenção”, pensa a biblioteca como um espaço arquitetónico, de educação, informação e cultural. Neste espaço tudo é permitido, desde que se satisfaça as necessidades dos usuários.

Ham…! por que os cinemas e teatros estão a ser transformados em igrejas? Será que precisamos tanto da “salvação” e não na mesma proporção da cultura e do conhecimento? Caros leitores, para não me alongar termino por aqui, contudo, ainda paira em mim as frustrações vividas no dia de hoje.

 

 

 

Comentários

  1. Essas mesmas bibliotecas poderiam estar a disponibilizar informação sobre o COVID-19...
    Enfim, abrem-se as salas de aulas mas não as bibliotecas!

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  2. Essas mesmas bibliotecas poderiam estar a disponibilizar informação sobre o COVID-19...
    Enfim, abrem-se as salas de aulas mas não as bibliotecas!

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  3. Gostei do texto, é de facto frustrante procurar sem sucesso um lugar para lazer.

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  4. Eis aí mais um desafio aos profissionais de biblioteconomia, visto que o que está em causa é o uma vez mais o acesso a informação e o uso correto dos locais, muito antes do contexto pandemia as bibliotecas públicas não ocupavam o seu devido lugar na sociedade a título de exemplo a biblioteca nacional quase que não existe pois é muito difícil a mesma se pronunciar sobre inovação na forma de como podemos ler e ter acesso a livros. Também é preciso diz que as bibliotecas digitais seriam uma grande aposta principalmente em um período como este que estamos a passar.

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